sexta-feira, outubro 5

Vulcão dos Capelinhos - 50º Aniversário - Ilha do Faial / Açores

Canto do Capelo (1957-58)
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Até à vulgarização das mais diversificadas observações do globo terrestre por satélites mais ou menos sofisticados, nomeadamente após a década de 80, a actividade vulcânica submarina era estudada com enormes constrangimentos. O Vulcão dos Capelinhos, por motivos que só a Mãe Natureza conhece, rompeu a crusta insular na mesma fractura de antecessores geneticamente idênticos (caso do vulcão do Costado da Nau), na extremidade ocidental da ilha do Faial.
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Senhora de Decq Motta e Dr. Luís Carlos Decq Motta
(autor das fotos), na actualidade
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Passados tantos anos, Capelinhos ainda se pode considerar único no mundo das Ciências Vulcanológicas nomeadamente por ter sido fotografado, observado, estudado e interpretado desde o respectivo início (cerca da 7h da manhã do dia 27.Set.1957) até ao "adormecimento", em calma tarde de 24 de Outubro de 1958. Tais condições resultaram da proximidade à ilha do Faial, a um peculiar eng. residente local chamado Frederico Machado (Director dos Serviços Distritais de Obras Públicas) e da equipa que ele constitui quer ao longo do período de actividade quer nos anos dos processos erosivos.


Vulcão em actividade (1957-58)
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Tais trabalhos foram naturalmente autorizados pelo Governador Civil Dr. Freitas Pimentel, médico de profissão, sensível às manifestações da Natureza e preocupado com a segurança dos habitantes que, por posição, lhe estavam confiados. A Junta Geral do Distrito Autónomo da Horta, através de todos os serviços então existentes, o Governo Central, nomeadamente através do Ministro das Obras Públicas eng.º Arantes e Oliveira, encaminhou para a ilha do Faial importantes recursos financeiros.


A erupção vulcânica (1957-58)
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A comunidade açoriana residente nos Estados Unidos, perante a catástrofe económica e social, influenciou a abertura dum crédito extraordinário de emigrantes (os denominados "sinistrados do vulcão") que, em pouco mais de um ano, reduziu os habitantes da ilha a cerca de metade.
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Cratera, o Final da Erupção (1957-58)
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Após quase 50 anos a "terra-nova" dos Capelinhos, atacada por invernias de diversas intensidades e cadências, encontra-se substancialmente reduzida (menos de 50%) mas ainda será por alguns anos um ex-libris faialense (para visitantes e para cientistas que observam no interior dos vulcões em destruição erosiva explicações de fenomenologias das fases activas).
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Cratera principal (1957-58)


A ilha do Faial, à semelhança de todas as restantes ilhas dos Açores, é de génese vulcânica e desenvolveu-se em 4 fases, temporalmente espaçadas. A mais antiga deve-se ter iniciado há cerca 800 mil anos e dela resultam as "lombas" da Ribeirinha, de Pedro Miguel e da Ponta da Espalamaca. A fase mais recente de cresimento da ilha enquadra o alinhamento de cones vulcânicos da zona do Capelo cujo extremo ocidental corresponde exactamente ao Vulcão dos Capelinhos.


A erupção vulcânica (1957-58)


Desse modo o Vulcão dos Capelinhos é uma das provas de que muitas das ilhas dos Açores se encontram divididas em sectores vulcânicamente activos o que, em termos práticos, significa que ao longo dos séculos irão surgir episódios vulcânicos em diversas parcelas insulares.O Vulcão dos Capelinhos é um dos mais paradigmáticos do mundo da Vulcanologia não só pela continuidade das respectivas observações mas também pela originalidade dos seus processos evolutivos.
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Farol dos Capelinhos (1957-58)


Ou seja, Capelinhos foi o exemplo sequencial do nascimento e desenvolvimento das ilhas açorianas: iniciou-se como vulcão submarino e terminou como vulcão terrestre. Capelinhos não apareceu de um momento para o outro. Antecederam-se períodos de actividade sísmica, iniciados nos primeiros dias de Maio de 1957 e cujos máximos energéticos se processaram entre 16 e 27 de Setembro de 1957.Na madrugada do dia 27, com a terra balançando continuadamente, os "vigias da baleia" do Costado da Nau, a escassos metros acima do Farol dos Capelinhos, notaram o oceano revolto a meia milha da costa, para os lados de oeste.
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Farol dos Capelinhos (1957-58)
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Assustados, desceram ao farol, alertaram os faroleiros e os seus companheiros de baleação, no porto do Comprido. Não era baleia, nem cachalote nem outro bicho qualquer – o mar entrava em ebulição e havia cheiros fétidos!! Chamaram-se as autoridades e lanchas e botes baleeiros zarparam para o porto do Castelo Branco. As famílias fizeram trouxas e foram juntar-se aos baleeiros. Às 7 horas o oceano já "fumegava" abundantemente e às 8 horas surgiram as primeiras cinzas, como jactos de criptoméria. Assim começou a fase submarina do Vulcão dos Capelinhos. Horas mais tarde apareceram outras 3 chaminés, num total de 4. Ao fim do dia havia uma coluna de vapor com mais de 4 Km de altura, visível de todas as ilhas centrais


Farol dos Capelinhos (1957-58)


Em início de Outubro as cinzas (tipo areias e pó com alguns blocos intermitentes de basalto) eram tão volumosas que se gerou uma ilhota, em feitio de ferradura, com entrada do mar virada a sudoeste – passou a chamar-se a Ilha Nova. Quando o vento rodava para oeste as cinzas caíram no Faial e destruíram tudo o que era vegetação. E com o tempo começaram a cobrir casas, quintais, pastos e caminhos. Entre 29 e 30 de Outubro a primeira Ilha Nova desapareceu mas a actividade reactivou-se em inícios de Novembro repetindo-se o fenómeno anterior (jactos de cinzas, blocos, nuvens ora altas ora anegradas com areias) - assim se formou a 2.ª Ilha Nova.
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Faroleiro junto ao Farol destruído (1957-58)


Até então os cientistas ignoravam que, em tal tipo eruptivo, existiam amplos deslocamentos do fundo do mar. Foi a primeira lição dos Capelinhos…Em Novembro a ilhota ligou-se aos antigos ilhéus dos Capelinhos (restos de erupção idêntica mais antiga) e daí surgiu um istmo até à ilha do Faial, prolongando-a. No dia 16 de Dezembro de 1957, perante o espanto de muitos curiosos, em vez de cinzas o Vulcão dos Capelinhos passou a lançar exuberantes repuxos de basalto fundido – um espectáculo emocionante!!!
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Crise sísmica, casa destruída (1957-58)


Nos fins de Dezembro regressou a fase de cinzas e uma vez ou outra observaram-se sinais de lava, especialmente ao longo de crateras alinhadas. A terra tremia continuadamente – era o tremor vulcânico, fenómenos explicado pelos cientistas que entretanto foram chegando dos quatro cantos do mundo. Entre eles veio Tazieff, o célebre vulcanólogo belga, que se tornou grande amigo das gentes do Faial e com quem convivi durante anos e anos.Durante o primeiro trimestre de 1958 predominaram os episódios de actividade submarina com emissão de jactos de cinzas cipressóides, pontiagudos, alguns impressionantemente altos e volumosos.
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Vulcão em actividade (1957-58)
- queda de cinzas e materiais de projecção -


Quando o vento rondava a oeste, na ilha do Faial era uma desgraça. As cinzas chegaram à cidade da Horta e o cheiro a enxofre invadia todo e qualquer lugar. Os centros vulcânicos migraram mais para leste, aproximando-se da "ilha velha". Além das cinzas, alguns blocos bombardeavam o farol, por sorte não atingindo os numerosos "mirones", a mais de 1 Km de distância.Durante esses 4 meses, desde Janeiro de 1958, Capelinhos exibiu numerosas variantes de actividade submarina. O istmo alargou e a "Ilha Nova" já se encontrava integrada no Faial, a "ilha velha". Constituíram-se praias longas que encheram as baias do Varadouro e da Praia do Norte.
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Dr. Luís Carlos Decq Motta (1957-58)
- residente da ilha e autor das fotografias -
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Em Maio de 1958 a paisagem do Vulcão dos Capelinhos sofreu profundas alterações: a fase submarina de cinzas passou a stromboliana, de bagacinas incandescentes, e na noite de 12 para 13 apareceu um lago de lava muito fluida com altos repuxos de basalto em fusão. Entretanto o centro Vulcão da Caldeira explodiu e emitiu cinzas muito finas, acinzentadas. Felizmente essa fase vulcânica concentrou-se nos Capelinhos e a caldeira não prosseguiu. A noite de 12 para 13 a ilha do Faial foi sacudida por violenta crise sísmica e algumas falhas geológicas deslocaram-se. Na área exterior da Caldeira algumas falhas geológicas subiram 1,5 metros e em outros sítios da Praia do Norte abriram-se fendas de 2 metros de largura.
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Religiosidade no medo (1957-58)


Aliás todo o casario da Praia do Norte colapsou e no Norte Pequeno e no Capelo muitas habitações sofreram danos importantes. Não morreu ninguém porque o eng.º Frederico Machado recomendou ao Governador Freitas Pimentel, no início da noite de 12 para 13, que a população se retirasse das suas casas. Foi uma decisão arriscada e notável!!! Recordo-me bem desses avisos… De Maio em diante o Vulcão dos Capelinhos passou inteiramente à fase terrestre, com emissão de bagacinas incandescentes e longos rios de lava fluida, ora em "lajedos" (tipo pahoehoe) ora em "biscoito" (tipo aa).
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**********************Casa Soterrada (1957-58)


Tal regime, que aumentou substancialmente a área da "terra nova" e que edificou o cone de bagacinas cujos restos presentemente se observam, permaneceu até Outubro de 1958. Foram emitidos 24 milhões de metros cúbicos de rocha basáltica em fusão. No dia 24 de Outubro de 1958, sem aviso prévio, ocorreram as derradeiras explosões strombolianas, de bagacinas avermelhadas. No dia 25 iniciou-se o processo de desgasificação, de arrefecimento e de erosão que perdura até aos tempos actuais.


Victor Hugo Forjaz - Capelinhos
Vulcanólogo da Universidade dos Açores e do Observatório
Vulcanológico e Geotérmico dos Açores

Memorial english version
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«Fotos cedidas por José Decq Motta»
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